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MAR ABERTO | A INVEJA DO FINAL DE ANO

por Boca Migotto

Mais um final de ano se aproximando e, novamente, os bares e restaurantes lotados para as festas da firma. Nessa época não tem crise nem tempo ruim. Ao menos, parece. Basta circular pela cidade a partir das 18 horas para percebermos isso. Final de ano é sempre assim, tempo de comemoração, confraternização e homenagens. E sempre há alguém que merece uma homenagem. Mesmo que, muitas vezes, quem as realmente mereça não necessariamente as receba. Assim como as premiações, outra modalidade muito praticada nessa época do ano.

Mas, se as homenagens até são justificáveis, o mesmo não se pode dizer sobre os prêmios. Estes, são sempre excludentes, bons apenas para quem os ganha. E estes sempre são poucos. Os escolhidos. E nem sempre os melhores. Afinal, o que é ser “o melhor”? Quem define? Com base em quais critérios? Os premiados, claro, ficam felizes, tiram fotos, postam sua conquista nas redes sociais e inflam seus egos. Para (quase) todos os demais, resta a inveja. Esse sentimento, a inveja, do qual todos sofrem mas o qual, por sua vez, ninguém admite sentir, ajuda a explicar os aplausos dos excludentes.

A preguiça é aceitável, afinal, “sou um cara tranquilo, a vida não é só trabalho”. A gula, em determinado período da história – e inclusive até bem pouco tempo atrás – chegou a ser considerada condição de bem estar e de riqueza. A gula, foi, portanto, o principal pecado da “elite”. Nesse samba dos pecados capitais, até a avareza pode ser bem vinda, dependendo da ginástica moral e verbal para justificá-la. A ira também é boa, e às vezes até aconselhável. A luxúria e a soberba, por sua vez, são mais difíceis de justificar, mas atire a primeira pedra quem nunca escorregou por elas. Assim, avareza, gula, ira, luxúria, preguiça e soberba são todos pecados capitais explicáveis e desculpáveis. Aceitos. Com os quais dá para conviver. Mas não a inveja.

Mais fácil passar um elefante pelo buraco de uma agulha que um ser humano admitir sentir inveja de outra pessoa. Embora, ao mesmo tempo e ironicamente, todos nós, homens, mulheres e crianças, somos invejados por alguém, em algum momento da vida. Para invejar, basta estar vivo, respirar e conviver com o próximo. Basta olhar para o lado e perceber que alguém sorri por algum motivo o qual nós gostaríamos de estar sorrindo. Mas não estamos. Então invejamos. Que sentimento difícil esse, não?

Toda vez que sinto inveja apelo para o meu lado racional, meus anos de terapia, meu autoconhecimento e, sobretudo, meu espelho, para tentar compreender e sufocar tal sentimento. Às vezes funciona, mas nem sempre. Tem inveja que gruda na gente como poeira. E nos deixa mais pesados. E nos deixa sujos de um sujeira que queremos esconder. Não há “inveja branca” que disfarce isso. Até porque a inveja branca não existe. Inveja é sempre um sentimento ruim, egoísta e o qual diz mais sobre nós que sobre os outros. E talvez por isso mesmo doa tanto. A inveja é como nos defrontarmos com nossas próprias incapacidades, inseguranças e insuficiências.

Por isso, na medida que o final de ano vai chegando, eu vou me fechando. Nem sempre foi assim, é verdade. Mas a cada ano que passa, mais me vejo refletido, como meus pais, no espelho do tempo. Quando criança o Natal era legal e o Ano Novo meio que passava batido. Para os meus pais, suas idades de avós e suas vidas miseráveis, no sentido de quem cresceu uma infância pobre, tanto o Natal como o Ano Novo eram dias como qualquer outro. Minha mãe contava que, quando criança, ela e os irmãos ganhavam quatro doces de açúcar no Natal. Ela, ao contrário dos meus tios, que devoravam todos eles no mesmo dia, os guardava por meses, para que assim pudesse preservar não apenas aqueles doces, mas também a boa lembrança que eles representavam. Para meu pai, tadinho, o final de ano era ainda pior. Nunca ouvi ele me contar que ganhou um presente quando criança. Talvez por isso, nem um nem outro sabiam ganhar presentes. Toda vez que eu lhes presenteava ouvia a mesma frase: “não precisava, pra que gastar dinheiro com isso”.

Não é de se admirar que o Natal e o Ano Novo não tinham nada de especial na minha casa. Quando eu era criança, eles até se esforçavam, mas logo o esforço esmoreceu e as noites, enquanto todos estavam comemorando, a gente estava indo para a cama. No mesmo horário de sempre. Ou até mais cedo. E como eu invejava as noites de Natal e Ano Novo dos meus amigos. Nem era preciso ganhar um presente – que não deixa de ser um prêmio – bastava uma noite iluminada. Apenas isso.

Mas o tempo foi passando e, em determinado momento da vida, fui acreditando que poderia, eu mesmo, quando adulto, fazer dessas datas especiais momentos também especiais. E, assim, transformar a minha inveja infantil em algo positivo. Tentei. Fiz até. Acreditei muito e por inúmeras vezes isso aconteceu de fato. Mas, na medida que eu também fui amadurecendo – para não dizer envelhecendo, afinal, tenho apenas 47 anos de idade – fui me vendo, também eu, mais introspectivo frente aquele mesmo espelho do tempo. Não apenas em relação ao Natal e ao Ano Novo, mas também ao carnaval, aniversários, Dia dos Namorados. Enfim, todas aquelas datas que nos dizem para comemorar. E para consumir.

Aos poucos, enquanto o mundo ao redor fazia dessas datas momentos especiais, comemorando sei-lá-o-quê-como-se-não-houvesse-amanhã, eu fui me fechando em mim mesmo e percebendo que não preciso ser alegre o tempo inteiro. Também não é preciso montar árvores de Natal para um Papai Noel inventado pelo marketing de uma empresa qualquer ou estourar um espumante produzido por mãos escravas na Serra Gaúcha.

Não vou dormir como se fosse qualquer outro dia do ano. Mas também não invejo mais as casas iluminadas, as luzinhas piscando sobre as árvores, as grandes famílias vestidas de branco e reunidas em total (?) fraternidade. Depois de Bolsonaro, na verdade, passei até a agradecer o fato de a minha família ser apenas três pessoas. Não cultivamos a obrigação de sermos felizes ao mesmo tempo que o resto do mundo. Foi assim que curei as minhas invejas de final de ano.

Para fechar esse texto, o último de 2023, quero agradecer quem me acompanhou por aqui. Quem me deu a alegria de ler meus textos, meus livros, assistir meus filmes ou torcer por mim. Mesmo que eu não tenha ganho nenhum prêmio (sic), da minha parte, prometo, seguirei tentando ser o melhor que consigo para 2024. E que sigamos juntos, refletindo sobre os motivos que nos fazem viver e produzir. Certamente, nada disso tem a ver com prêmios, mas com autoconhecimento. Obrigado a todas e a todos. Até o ano que vem.

 

I. BOCA MIGOTTO

I., de Ivanir, Boca Migotto é cineasta, pesquisador, fotógrafo e escritor. Publicitário formado pela Unisinos, cedo se deu conta que estava na área certa – a Comunicação – mas no curso errado. Formado, então, largou tudo e foi para Londres. Nos dois anos que permaneceu na Inglaterra fez de tudo: lavou prato, fez café, foi garçom e auxiliar de cozinha, estudou inglês e cursou cinema na Saint Martins College of Arts and Design. Ao regressar para o Brasil, fez Especialização em Cinema e Mestrado em Comunicação, ambos pela Unisinos. Nesta mesma instituição, foi professor de Documentário no Curso de Realização Audiovisual, onde permaneceu por dez anos, atuando também em disciplinas dos cursos de Jornalismo, Comunicação Digital e Publicidade. Finalizou seu Doutorado em Comunicação pela FABICO/UFRGS, com extensão na Sorbonne/Paris 3. Foi quando morou em Paris, aliás, que decidiu lançar seu primeiro livro de ficção “Na antessala do fim do mundo”. Como cineasta – diretor e roteirista – realizou mais de vinte curtas-metragens e séries de TV, além dos longas-metragens “Filme sobre um Bom Fim”, “Pra ficar na história”, “O sal e o açúcar” e “Já vimos esse filme”. Em 2021 lançou seu segundo livro “Um certo cinema gaúcho de Porto Alegre”, resultado da sua pesquisa de doutorado. Neste ano de 2023 está lançando seu terceiro livro “A última praia do Brasil” pela editora Bestiário em parceria com a Rede Sina. Atualmente é graduando em História- Bacharelado na PUCRS.
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