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Veríssimo às vezes lembra Chile | por Vitor Biasoli

No verão de 2010 fiz uma viagem ao Chile com minha companheira. Um ano antes fora sozinho a capital chilena para um congresso (encontro de pesquisadores das religiosidades latino-americanas) e quis repetir a dose, mas sem compromisso e bater pernas à vontade pelas ruas de Santiago, visitar alguma vinícola e conhecer Viña del Mar, uma cidade na beira do Oceano Pacífico, com praia e tudo mais.

Em Viña del Mar (num passeio feito por agência de turismo, numa van confortável com outros viajantes) visitei uma praia e matei uma fantasia: colocar os pés nas águas do Oceano Pacífico. Na verdade, a fantasia completa era a de tomar um banho nas águas do Pacífico (vá entender um desejo desses!), mas descobri que a água desse mar é fria e não me animei a molhar o corpo inteiro. A praia estava cheia de gente na areia, apenas meia dúzia dentro da água e entendi que não era somente eu que não me aventurava ao banho. Que mar gelado!

Lembrei disso relendo um romance de Luis Fernando Veríssimo, O Jardim do Diabo (Ed. Objetiva, 2005, 180 p.), que li durante a viagem. Uma paródia de narrativas policiais, daquelas em que o criminoso deixa pistas enigmáticas que o leitor vai quebrando a cabeça para decifrar. No caso da trama criada do Veríssimo, um texto narrado por um escritor de livros policiais de banca de revista, 42 anos, que vive isolado num apartamento de uma capital brasileira (sem relação alguma com o mundo chileno). Ele narra a visita de um inspetor que investiga um crime semelhante ao que ele descreveu no último romance (cheio de mensagens cifradas) e, ao mesmo tempo, escreve um novo livro e relembra a sua história familiar (centrada na morte do pai, vinte anos atrás, num tiroteio misterioso). Ao final, o escritor descobre que inspetor é o seu meio-irmão, que anda temeroso em relação à possibilidade do escritor abordar o caso da morte do pai num dos seus livros.

Narrativa sem nenhuma relação com o universo chileno ou com o que vivi na viagem de férias, mas que serviu para rememora-la. Lembrar, por exemplo, da minha mulher e eu no mirante do Cerro de Santa Lucia (marco oficial da fundação de Santiago no século XVI) observando a monumental Cordilheira dos Andes e tentando saber o nome dos picos mais altos. (Eu achava que dali se avistava o Aconcágua e me enganei.) Recordar que ficamos admirados com a banheira no quarto do hotel e preparamos um banho a dois numa temperatura agradável. Releituras tem dessas coisas: ao mesmo tempo que relemos o livro, nos lemos também. Lemos aquilo que fomos e vivemos enquanto líamos o livro pela primeira vez.

No caso do romance do Veríssimo, o “Jardim do Diabo” do título se refere à imaginação desenfreada do solitário escritor de romances policiais, sua enigmática narrativa do inspetor que o investiga e tenta entrar em sua mente, intercalada pela escrita de um novo livro (com intrigas mirabolantes), mais a confusa lembrança da morte do pai. Uma sucessão de episódios (sempre narrados com bom humor) que ficam com final aberto.

Quanto a mim, um reles leitor, nenhuma lembrança alucinada e apenas “recuerdos” de viagem tranquila: um mar gelado num dia de sol quente, um banho de banheira na temperatura certa, a Cordilheira dos Andes exibindo a sua monumentalidade branca e distante abraçando a capital do Chile.

 


Foto: Dartanhan Baldez Figueiredo

Vitor Biasoli

Nasceu em Pelotas, em 1955. Graduado em História (UFRGS), fez mestrado em Letras e doutorado em História. Lecionou 38 anos, um tanto no Magistério Estadual ou tanto na UFSM, e hoje está aposentado. Publicou livros individuais e coletivos, entre eles “Calibre 22” (poemas) e “O fundo escuro da hora” (contos). Faz parte daTurma do Café.
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