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10 poesias de GABRIELA CARDOSO

Eu Sou Mais
Sobre o leito da manjedoura, eu nasci
tal Maria, Eva, Pandora, pobres místicos bodes expiatórios
desenvolvida pelos entraves em meu caminho, quando meu pé cruzou o destino do bicho infecundo — o mais covarde — julgando-se ser sublime desfez-se em pó pelo esboçar da dialética perigosa: não! — e isso já bastou
Da terra seca de sementes sufocadas
vi tantas, tantas, tantas, todas de raízes machucadas
da pluralidade das espécies, que de milhares estipes dão a mesma flor,
mas não se reconhecem
Do cerne do útero aos lábios, à mercê do Estado,
intrincada nas frestas dos dentes do bicho recalcado, padeci.
Larápios de vaginas, aquilatadores de hímens
formadores de tristezas complacentes, que não se rompem
desconhecedores de vulvas, clitóris, sabores
embebidos em egos frígidos que gozam sozinhos
Na gira, aos ritmos do barravento que varrem
levando à anestesia e frenesi implícito dentro do peito,
encontrei-a
“arreda homem, que aí vem mulher!”
não havia espaço para espelhos
o outro, outro, outro no reflexo enfim se apagou
No epitáfio, estará escrito e sacramentado:
eu sou mais, muito mais que tudo isso.
Eu sou mulher.

Café de Amanhã
Pão na chapa enche de açúcares
os vasos sanguíneos do burguês ao acordar
de açúcares padece o corpo cansado
sem pão na chapa na mesa ao levantar
Frutas fornecem nutrientes essenciais,
lipídeos e vitaminas que enchem o cérebro de energia;
uma uva, uma manga, uma banana
trocam de preços todos os dias no mercado:
a saciedade está tão cara comprar!
Mas o pão, o pão têm simbolismo divino
na alimentação
foram multiplicados, são o corpo de Cristo
cada pedaço fora dividido após terem sido ungidos
em suas santas bênçãos
Hoje, à mercê do Estado
que não é divino,
nem pai, nem democrático,
o pão, de tão caro contrasta desigualmente
com miseráveis salários
condenando à inanição!
O pão divide o burguês do proletário;
enquanto a mão de um estica-se
para no miolo algo ali passar
outras, juntas, rezam à noite
para quando, no café da manhã
do amanhã,
o estômago logo acordar.

Espelho de Afrodite
Entre constelações, esferas rochosas, violentas estrelas mortiças e cintilantes cometas, nascer Vênus pode ser considerado uma afronta ao restante dos planetas
Pisando em trompas, ventres, ovários e vulvas e aquela mistura que poucos sabem ao certo o nome, lambuzo-me de sangue menstrual derramado nas ruas
Há polícia? O que há? Será que alguém me escuta? É claro que não, eu sou notícia corriqueira de uma realidade fantasticamente banal
O sangramento da violência não é repudiado, apenas é visto com asco aquele que mostra que sou um ser próprio, forjada em minha natureza
sem ser sexy, sendo apenas espécie
e que sinto por fora e por dentro me desmanchando em vermelho
A liberdade nas linhas sinuosas das páginas Legais só existe por lá
Lá, lá onde a lei é dos homens e julgada por eles, onde ela morre sem ser usada enquanto a sociedade ainda não evoluiu ao ponto de efetivá-las nas calçadas, nas pedras soltas que marcam, dentro de casa, que muitas vezes machuca mais que as ruas desconhecidas
Há alguma que diga que de fato sente-se livre? Tem certeza? Grite para o mundo! Veja as mãos lhe tapando a boca
Mas eu nasci sob este manto, eu sou pudica para quem decide que sou, mas sou promíscua por pouco, pois não nasci com respeito em mim, eu preciso me dar, preciso me encaixar no que consideram uma mulher correta antes
pois sou espelho de Vênus, Afrodite, com Ártemis escondida na mente
Na beleza estranhamente contraditória dos males do mundo que em meu colo foram jogados
Sou Eva, Pandora, Lilith
Atiramos fogo nos deuses
Só servimos quando somos santas e não como seres
A causadora não foi a maçã, a caixa, ou a força
Mas a liberdade, que é a verdadeira desgraça causadora de tudo desde os primórdios para quem não aceita que existimos por nós mesmas
Eu não vim de uma costela, você veio de um útero!
Sou espelho de Afrodite, ensinada desde a infância a ver o outro refletido nele
Que tem dentro do peito contos de fadas, o amor idealizado, as belezas, mas sempre encontrando pelo caminho tudo aquilo que prefere deixar esquecido no passado
O papel feminino delicado criado socialmente não condiz com a realidade
Ser mulher é violento, feio, pesado!
Não por nós mesmas, mas pelo que nos é ofertado
Que minhas características não sejam consideradas fraquezas, uma vez que, ser forte não é apenas criar dor, mas também aguentar, ultrapassar, superá-la
Quero ser considerada louca, histérica, desequilibrada
Pois a mudez me rasga e aquelas que a utilizam não personificam-se em ser, elas nunca vivem suas próprias vidas pois nessa realidade o tom de voz que chega aos tímpanos é apenas o grito
Quero o luxo de desagradar, de não servir, de não me preocupar com os reveses de apenas existir
Não quero ser tocada, chamada
Quero passar despercebida nessa jornada
Quero ser o centro do meu problema, quero falar de mim, não do outro
Agora sou eu, fique em silêncio e espere a sua vez!
Desejo não ser considerada complicada, complexa, incompreensível, pois julgam-me a partir deles mesmos e não a partir de minhas próprias características
Eu existo, eu existo!
Eu possuo vontades
Eu não quero ter filhos, não quero casar, quero liberdade!
Pois sem ela, tudo que eu fizer apenas me aprisionará mais dentro do gênero dessa casca
E a pergunta que nunca quis calar, desde Nietzsche até Freud, ninguém conseguiu nos entender, será que ao menos tentaram?
Pois respondo
O que quer a mulher? Poder ser ela e dela mesma!
Somos a mater dolorosa que sangra pela vida, sem vontades, que é usada ao bel prazer alheio, aberta quando necessária, fechada para si mesma, sem nunca dar à luz a sua própria existência no mundo
Em uma constelação escura de galáxia sem saída ou então, debaixo do mesmo teto, em plena luz do dia, eu não estou segura
Não interessa a idade

Como de costume, no caminho, olhos maliciosos, boca salivando espreitando coxas, seios e nádegas. Na mira, a passos rápidos pela rua, ela questionava-se: o que mais precisaria fazer para demonstrar ser apenas uma criança voltando pra casa?

E aquelas ruas nunca mais a viram passar por lá
Há pouco tempo, a poetisa que vos fala, inundada em preconceito, estaria assinando esse texto apenas com as iniciais do seu nome ou com um pseudônimo masculino, hoje em dia bato no peito e digo: — SOU LUA! — em caixa alta
Sou mulher escritora! Escrevo porque quero, escrevo porque acredito que a arte muda a realidade e embeleza o mundo, escrevo porque sinto e as letras são a minha voz,
escrevo para não ser só mais uma nas estatísticas de um país omisso a nós!
Mas enquanto redijo torto e coloquialmente sobre ser mulher
buscando as palavras necessárias para findar a poesia,
só encontro significados dolorosos em cada linha do dicionário feminino.

Aquém-mar
Lá no horizonte além-mar
Outra vida
Outras pessoas
Outros lugares estão a me olhar
Lá, onde as ondas quebram macias
a temperatura da água é agradável,
a poesia sai livre pelos dedos
e o canto dos pássaros faz companhia
Lá nas rochas, sem limo, sem aspereza
Onde a dureza corre medrosa
E fica apenas a calma silenciosa
Para ouvir as ondas fazendo orquestra sinfônica na beirada da orla
Lá no horizonte além-mar
Um dia ansiosa eu hei de estar
Observando o aquém-mar
A desejar estar do lado de cá.

Caligrafia
Eles verão
que eu inverno
e que quanto mais cedo
menos amanheço
e quanto mais morro
mais fácil são minhas subidas
Eles mares
enquanto eu rio
eles são até demais
enquanto eu fujo da sanidade
eu acendo a cada aurora
enquanto eles nem a contemplam
procurando a cada dia ascender ainda mais nas coisas terrenas
Enquanto eu concerto,
eles não ouvem
enquanto eu vazo em flores,
nos vasos de terra da vida tecendo poesia
eles preferem estar consertando seus credos
com o choque de cada espanto
Na sessão mais solene, nós selaremos um beijo
enquanto eles cerrarão os olhos
enozando cada sentimento sem cessar
atrelando como homônimos dois distintos intocáveis
o amor e o ódio
que só são semelhantes a quem jamais sentiu cada qual
Dando o ensinamento certeiro, de que na vida,
tudo vivido deverá servir para deixá-lo mais vívido
e que para ser leve, o único acerto é que se leve a certeza
de que o verdadeiro presente jamais se traz,
pois ele pesa e é difícil carregar e que o único presente é o agora
e resolver o passado ou deixá-lo de vez para trás
Eu cito em minha caligrafia exotérica
meu nascimento tardio, minha morte prematura,
minha incipiente vivência e todo o ensinamento esotérico de onde me situo
pois enquanto eles seguem desesperados buscando um caminho encontrar
eu caminho plácida a seguir buscando o desencontro trilhar.

Resposta Existencial
Abri as portas do tempo num dia nublado que cingiu a luz da autora,
segredei a um querubim ter dedos de Héstia e paixão de Ares na terra enquanto aguardava o padecer solene do voto de Minerva
pelos erros do passado recôndito
Em meus lábios repousava o sabor da água doce, tal como sente o beija-flor,
folheando as páginas amareladas da pele, encontrei o trecho demarcado de outrora: “assim como a flor precisa de água, o amor só nasce na vida, onde ali ele descansa” — e em meu rosto uma lágrima escapou
Lembrei do pulsar dos verões quentes sob a luz solar da tarde,
saboreei aqueles últimos grãos arenosos da minha boca numa epifania desgarrada:
— qual o sentido da vida fora do meu corpo, será que ainda assim é limitada?
A dureza me tocava, tal como toca o olodum no Pelô,
tão forte, intenso e impetuoso,
era o sagrado sempre desfazendo-se num status breve de sentido ainda mais temporário que só cabe a quem perguntar se atreve
Suspirei mais um dia, era brisa mundana que entrava desbravando a lacuna das minhas narinas, eu ainda não sabia a resposta para a pergunta,
lamentava ser poeticamente analfabeta e para ler a vida,
desde a eternidade até breve,
é preciso entender poesia.

Terceira Pessoa no Auto-retrato
Fora encontrada ouvindo música no radinho de pilhas quebrado,
ligado à tomada oca do disjuntor desligado,
jogando garrafas velhas vazias ao pé da cama
que na boca deixaram seu líquido hidratando a garganta
No sofá cheio de buracos,
soltando fios por todos os lados,
cheirando a mofo que também escorria da parede verde semelhante à papelão,
erguendo a perna sem circulação
para deslizar o sangue
No chão, poeira, guimbas, folhas e vida
circundando os mesmos movimentos repetitivos dos neurônios-errôneos-caóticos
da cabeça de cabelos frágeis e quebradiços
criando amontoados de fios pelo chão
Salivando saudade, engolindo letargia
lá pelas 14:00 ou 20:00 horas do dia 6 ou 30 de agosto do século XVII
deslizando uma perna na outra
procurando um dos buracos do teto que sempre acolhia
Em frente à pia transbordando, uma bicicleta enferrujada,
que tinha mais utilidade que a escritora que só escreve quando não faz sentido,
é assim que ela contorna a sanidade
e deixa só a loucura escrita nas linhas.

Verborragia
É nos confins das mentes silenciosas
Que adormecem os verbos pungentes
Inflamados por salivas raivosas
São ricos em sentimentos latentes
Os sons que os ouvidos guardam
Reverberam pelos séculos encerrados
Emergem em meio a noites nubladas
E transbordam nos travesseiros
As noites longínquas agonizam em meio às luzes oscilantes da lua cheia
Solitária e flutuante
Despede-se no raiar do dia enquanto deixa seus apaixonados carentes
No embalar da melancolia
Em meio aos minutos escorridos
Com a cabeça latejando o vácuo
O grito se torna inaudível
O peito refreia todas aquelas emoções
Adormecidas
Mas os ouvidos inocentes
Não possuem proteção contra os sentimentos penetrados
E no epílogo do corpo
Eles são apenas a porta de entrada das emoções
Não são eles que sentem
Os sons são carregados pelas veias que os levam até o coração
Esse quieto e dormente
Sente mesmo com sua derme grossa
Roupa que o veste
E sua clava de ossos na frente
Sua eclosão se dá para o corpo inteiro
Da ponta dos dedos
Percorrendo pela pele
Passa pelo rosto
Chega até a cabeça
Assim seus circuitos são acionados
Suas sinapses erram os trajetos corriqueiros
Uma tropa de pensamentos de berço
Voltam a sibilar raivosas na mente
As letras liquidificam-se
Perdem-se entre as vísceras
Preenchem os espaços
Até não mais caber e sair pelas chuvas torrenciais do corpo
A alma não escuta, não fala,
Pois quem sente é a carne
Que se desmancha em gotas pela face
Quando as palavras perversas,
Deveras diretas, a fazem pingar.

Mudez d’alma
Eu já escrevi com giz
Desenhei na poeira
Risquei o chão com pedras
E sangrei as paredes
Meu tom monocórdico
Meu tom grave
Ou o meu tom suave
Não foram ouvidos
Meu gritos repetitivos
Minhas manhãs desesperadas
E meus choros noturnos
Nunca foram vistos
Gritei ao mundo
Meu tom mais agudo
Foi jogado ao vácuo
E resumido ao tom mudo
Sem ser entendida
Pensei estar falando outra língua
Talvez fosse de outro pais
Mas descobri que meu idioma não estava sendo ensinado no mundo
Já pensei ter ouvidos débeis
E acreditei não estar escutando as palavras alheias
Me esforcei por um resquício de som
Mas percebi que eu estava no silêncio
Sem ter respostas em sons
Tentei olhares, suguei visões em busca de estar sendo vista
Busquei gestos
E decretei que por não estar vendo, eu mesma era cega
Mas no fim, descobri que minha’lma não é muda, nem cega, nem surda
Apenas é ignorada.

Léxico dos Sentidos
Cansei de regras
Teoremas
Cansei das ênclises
Próclises
E sempre detestei as mesóclises
Querer-te-ei?
Como poderia querer-te no futuro?
Ter você agora seria o único presente mais que perfeito aceito pelas minhas linhas
Preciso criar um novo tempo pro pretérito
Um que eu possa usar em qualquer texto
E sirva para todos os momentos com você
Eu quero rasgar o verbo
Expulsar todas as minhas hipérboles
Como alforria
Quero gritar interjeições
Sem analogias
Quero a palavra nua
E sentir todos os paradoxos da minha existência saindo pela boca
Não quero o uso correto do idioma
Quero gaguejar
Me lambuzar nos erros
E delirar entre as palavras tão livres expressadas
Quero cuspir palavrões
Buscar o sentido pejorativo
Escrever fora das linhas
Rabiscar tudo escrito
E quem sabe rasgar a folha
Quero me libertar da minha forma humana
Amar outras espécies
Afiar minhas presas
Usar minha prosopopeia
E me transformar em quem
talvez seja quem de fato sou
Eu quero a sinestesia
Aprender
Prender
A tua língua em mim
E jamais usar amar no verbo oculto
Eu quero abusar dos neologismos
E encontrar a palavra exata que sirva como palíndromo
Que mesmo que você leia de outras direções, o sentido será o mesmo
Mas antes, não se esqueça de respeitar meus parágrafos
Pois são eles que definem o começo
das minhas histórias
Então, engula minhas reticências
Não pause nas vírgulas
Saboreie cada silêncio
E você estará sentido o verdadeiro gosto do meu léxico
E o que vem depois serão palavras sinceras
sem pontos finais.

 

 

Maria Gabriela Cardoso, 24 anos, gaúcha atualmente morando em Santa Catarina. Membro do Coletivo Escreviventes e idealizadora do Coletivo Literário Escribas. Escreveu seu primeiro conto “Ela Era Eu” aos quinze anos, mas só passou a pensar na possibilidade de ser escritora aos dezenove anos após ler a biografia de Clarice Lispector. Aos vinte e um anos, passou de fato a se dedicar profissionalmente à escrita, tornando essa, a sua profissão. Escreve contos, poesias, crônicas e novelas com o pseudônimo Lua Pinkhasovna para revistas, podcasts e antologias, assim como também para seus canais intitulados Excertos Diários

       

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