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AMANHECEU EM MIM POR ROSANA ZUCOLO

Dias atrás reli um texto do Luis Fernando Veríssimo, “Auroras”, escrito e publicado no jornal Zero Hora, no ano de 2007. Ele dizia, entre muitas coisas, de uma bonita expressão em inglês, cuja tradução para o português significa: “amanheceu em mim”.  No inglês, a expressão é empregada quando a pessoa tem uma revelação, apreende algo, se dá conta de: “It dawned on me”. Uma metáfora pronta e reincidente, segundo ele: o amanhecer, a aurora, o alvorecer que sai pelos olhos.

Um texto literário é uma obra aberta, tal como propõe Umberto Eco. Assim, fiz um recorte no desenvolvimento proposto por Veríssimo e me deixei levar pelas infinitas possibilidades de associações. Pus-me a pensar sobre onde estariam os alvoreceres, o brilho nos nossos olhos e as auroras tão necessárias neste momento em que andamos  carentes de vitalidade e de recomeços. Hoje, os olhares estão opacos. Têm refletido nossas dores, cansaço, tristezas, preocupações, pesares e desalentos, resultado deste período sombrio marcado pelo sofrimento e por muitas perdas, das concretas às simbólicas. O quê nos leva a perguntar: – Aonde foi parar a esperança? E a imaginação criativa?

O neurologista e escritor Oliver Sacks(1933-2015) dizia que o ato de ver e olhar, não é só olhar para fora, para o visível, mas também para o invisível e que isto constitui a imaginação.  Olhos de ver e de refletir o quê e como vê. Um exercício de sensibilidade e amplitude em relação ao que acontece à nossa volta. Talvez, quando se sai do ambiente habitual, a percepção do todo se torna mais aguçada. Ao menos, acredito que aconteça desse modo com a maior parte das pessoas ou com aquelas que não se recusam a ver e sentir.

Tal reflexão trouxe lembranças de algumas experiências de percepção muito significativas sobre o olhar que alvorece. Elas nunca saíram da minha memória.

Anos atrás estava no MASP, em São Paulo, quando acontecia uma exposição dos murais de Cândido Portinari. Os painéis do pintor são impressionantes! Tanto, ao ponto de fazerem qualquer um chorar diante das telas. Entre  as telas estavam “Os retirantes” e “Criança morta”, ambas um retrato realístico do drama dos nordestinos em busca de uma vida melhor e a “falar” diretamente com quem as contempla.

Fiquei profundamente impactada diante delas e nesse ínterim, do estar tomada pela emoção e da consciência concreta de um espaço físico, me deparei com o ator Stênio Garcia. Ele entrava na galeria com alguém e ambos vieram em minha direção. No momento em que nos cruzamos, fiquei atônita porque vi o “alvorecer” nos seus olhos. Era tal o brilho naquele olhar que me deixou perplexa! Talvez eu tenha entendido ali o significado do ato da tietagem que envolve as celebridades midiáticas. De repente, alguma singularidade te arrebata e, não raro, se exacerba.  No entanto, naquele instante, ele parecia ser apenas uma pessoa iluminada, uma espécie de bodhisattva. Poderia  simplesmente estar apaixonado e feliz, pois vinha de mãos dadas com a namorada, companheira, esposa, amante ou qualquer outra relação que ali se fazia pública. E estava impregnado de uma luz radiante, contagiante que, literalmente, “saía pelos olhos”. Desde então, passei a ficar mais atenta ao trabalho dele ( e sem tietagem).

Penso ter encontrado outras pessoas tomadas por essa espécie de plenitude. Pode ser um instante de vida, um modo mais permanente de ser, mas todas capazes de envolver o outro com sua aura.

E para algumas desta pessoas, a aura transcende o tempo de vida e permanece em suas obras. Durante uma ida à Fundação Joan Miró, em Barcelona, Espanha, estive na ala dedicada à história de vida do pintor. Quem a visita encontra uma exposição de retratos de Miró ao longo dos seus 90 anos vividos. O que a torna particularmente impressionante é a constatação de que, na medida em que o envelhecimento do artista catalão era registrado em fotografias, a expressão e o brilho dos seus olhos adquiria um aspecto vívido, quase surreal.

A inquietude criativa do pintor que não se deteve apenas às telas e tintas, é marcadamente presente em seu olhar, num movimento ascendente e contrário ao do tempo cronológico. Recordo que em uma das fotos, em particular,  seu olhar refletia um misto de vida, raiva e resistência e vinha acompanhada de um depoimento do próprio: “Quando ocorreu a invasão nazista na França e com a vitória dos franquistas, fiquei convencido de que eles não me deixariam pintar mais, que eu só podia ir à praia para desenhar na areia e desenhar figuras com fumaça de cigarro. Ao pintar as Constelações eu tinha a sensação de trabalhar escondido, mas era uma libertação para mim, porque dessa forma eu não pensava na tragédia que me cercava.”

De algum modo, é preciso enfrentar as tragédias com as dores  advindas, para que os alvoreceres aconteçam. Que volte a amanhecer em mim e em todos nós.

 

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