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Ressonância social por Mel Inquieta

Ontem ao fazer um exame de ressonância, o técnico me informou que eu deveria manter os olhos fechados durante 30 minutos, principalmente na hora em que o barulho aumentasse.

Deitei, me colocaram dois fones de ouvido, mobilizaram meu pescoço com um aparelho de metal, colocaram na minha mão esquerda uma campainha para tocar caso me sentisse mal. Logo vi meu corpo entrando naquela máquina. A sensação de claustrofobia é enorme, impossível não associar com um caixão. Perguntei se havia uma música zen para colocar, o técnico me disse que antes tinha, mas o Ecad (Escritório Central de Arrecadação – um órgão privado, fundado em 1976 para arrecadar os direitos autorais de cada música executada) apareceu querendo cobrar a reprodução por dia. Pensei: que insensibilidade do Ecad, ainda mais nesses tempos. Eu já paguei eles para um evento, mas jamais imaginaria que pudessem cobrar num local desses.

Entrei sem música, lembrei da personagem de um dos meus contos que revisa suas memórias num estado quase que vegetativo. Ali, eu não podia me mover nem ver, só lidar com meus pensamentos.
A máquina começa a emitir um som estridente, fecho os olhos. Quanto mais ele aumenta mais sinto raiva do Ecad. O técnico disse que eu poderia abrir os olhos nos breves intervalos entre um som e outro.

Momentos que pareciam um respiro naquele afogamento sonoro.

Uma nova “trilha” começa, aquela sequência de sons repetitivos pareciam uma série de tiros, uma metralhadora. Lembrei do seu Júlio, motorista de aplicativo, que me contou que foi aposentado pelo exército por ter ficado quase surdo de um ouvido. “Eu atirei demais, o médico disse que devo ter dado mais de 50 mil tiros”, disse. Logo me veio uma imagem que há pouco tinha visto,  a do corpo do Lázaro Barbosa,  o spree killer recentemente morto numa “caçada” quase que medieval.

O barulho da máquina de ressonância aumentavam e com ele as memórias de uma sociedade que comemorava um assassinato com buzinas e dancinhas. A imagem dele não desaparecia, parecia encostar na minha pele, como se fôssemos um. Eu não sou o Lázaro! Era a vontade que eu tinha de gritar! Tentava mudar de pensamento, mas não conseguia,

essa sina de me colocar no lugar do outro é tão forte quanto a minha razão.

Sofri pelas vítimas que ele fez, pela mãe que o pariu, pela sociedade que comemora mais o assassinato que a recuperação moral de um criminoso. Enquanto aqueles sons aumentavam e diminuíam, lembrei do documentário que fiz sobre a reabilitação de jovens infratores, da fala do diretor do Case (Centro de Atendimento Sócio-Educativo / antiga Febem), do orgulho que ele e os funcionários sentiam ao dizer que um dos meninos foi parar na França pelas cestarias que aprendeu a fazer em umas oficinas dentro da instituição. Lembrei também das notícias dos modelos de prisão na Europa, onde eles devolvem a dignidade do ser humano os ensinando, e que estes modelos de prisão tem os mais baixos números de reincidentes, e da tantas prisões fechando por falta criminosos nestes países.
Também me vieram imagens de milhares de notícias de mulheres assassinadas pelos companheiros. Do arcabouço social onde uma patroa é incapaz de cuidar do filho da sua empregada. Do menino Miguel em busca da sua mãe, da cidade que não ouviu o menino Bernardo e permanecerá sempre sob o véu da culpa.
São muitas falhas estruturais, que ajudam a reforçar que antes de tudo é

preciso reabilitar a empatia.

O exame acaba, saio meio tonta. Retiram o aparelhos e me perguntam.
– Você está bem?

Não estava, mas fiquei pensando: será que não é essa a pergunta que falta para começarmos a mudar cada dia?

 

O FRIO, AS RUAS E UM MORADOR AQUECIDO PELOS SEUS CÃES

Pouco antes de chegar no local do exame médico, num dia gelado que não chegava a fazer 10 graus, vejo um rapaz dormindo na rua apenas com uma coberta bem leve. Junto a ele, dois cães dormem. Peles que se aquecem tanto quanto um pedaço de pano. Estou no carro, não podia parar, nem perder o horário do exame. Bato uma foto, mando-a para um colega da prefeitura e um outro da imprensa, indicando o local. Quando deixo o exame, recebo mensagens sobre a repercussão da imagem. Nos comentários, várias pessoas sensibilizadas e uma questionando justamente o ato de fotografar. Embora o jornalismo cotidiano não faça parte da minha rotina, me vi no lugar dos meus colegas que todo dia são duvidados e questionados em sua profissão, seja nas redes sociais ou mesmo na rua.

Recentemente a prefeitura fez um encaminhamento de diversos moradores de rua à casa de passagens, mas vale lembrar também que muitas dessas pessoas também precisam de assistência para cura de seus vícios.

E curar um vício vai muito além de uma internação. É preciso resgatar a dignidade.

Julgar suas razões por insistirem em permanecer nas ruas, não trazem soluções. E esse resgate pode vir das esferas públicas, privadas e, acima de tudo, de educação mais empática da sociedade.

 

AS FOTOS

Morador de rua dorme na Av. Presidente Vargas próximo a Floriano Peixoto com seus cães em 29 de junho de 2021 em Santa Maria-RS quando a temperatura na cidade não atingia 10 graus.

Cedida para o portal parceiro da Rede Sina, Paralelo 29.

 

PUBLICADO EM:

 

REVEJA NA REDE SINA

 

Bate-papo: Reinaldo Santos (live)

BOCA DE RUA

 

DICA:
O Jornal Nacional recentemente fez uma sensível campanha mostrando um pouco da vida de jornalista.

 

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