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Série da Netflix sobre a boate Kiss estreou dia 25de janeiro. Foto: Divulgação.

Relembrar o passado é salvar vidas no futuro | por Paulo Carvalho

Sobre conteúdo das séries da boate Kiss, Netflix e Globoplay:  Parece que muitos não estão vendo que a série da Netflix é uma denúncia contra a impunidade. A partir do fim do 2° episódio em diante, pode ser vista a luta dos familiares por justiça. O filme é uma DENÚNCIA com todas as letras.

Reproduções na ficção com cenas e diálogos reais, várias com exatamente as mesmas palavras ditas.

A base da série gira em torno dos pais processados, Flávio, Sérgio, Paulo e Marta. Foram processados pelo MP porque criticaram a omissão e corporativismo quando o MP retirou do processo os responsaveis públicos da prefeitura e nao permitiu que o próprio promotor à epoca da tragédia fosse investigado. Essa é a base do filme. É muito importante que isso leve a maior prevenção, a que não mais aconteça.

Recebemos várias manifestações de pessoas preocupadas com seus filhos nas baladas. Denunciando locais inseguros. Esses dias atrás foi fechada uma boate em Porto Alegre com sérios riscos de acontecer algo parecido e que se saiba, muitas casas de Show, boates, bares, centros de culto, recreação, lazer, clubes, locais de festas de aniversário e casamento, prédios principalmente antigos, residências, hospitais, cinemas, muitos desse locais estão em condições inseguras.  Tragédias que acabam matando todos os anos mais 3 mil pessoas. (Dados das seguradora). A imensa maioria pouco noticiada. São as pequenas tragédias com poucas vítimas em cada uma, mas acontecem nos mais de 5.600 municípios do Brasil.

Quanto a outra série, o documentário da Globoplay mostra além daquela noite logo no início do documentário, a mesma busca por justiça. O que aconteceu com as famílias e vai até o julgamento e a anulação . Ali pode-se ver os depoimentos de familiares e sobreviventes, advogados da defesa e da acusação, a petição e o processo na Corte Interamericana de Direitos Humanos, juiz do júri, promotores e também os réus, cenas reais. Também o mesmo absurdo e indecente processo contra os pais.
Choca como a defesa dos réus se portou várias vezes de modo leviano e maldoso durante o julgamento provocando os familiares com a intenção a que o julgamento fosse anulado.

São duas séries que denunciam o nosso sistema de Justiça. A Justiça lenta que levou 10 anos e ainda não puniu todos os responsáveis.

Diferente da Argentina e EUA que puniram exemplarmente responsáveis por tragédias semelhantes. Na Justiça desses países houve a rejeição do judiciário contra apelações sem sentido, que aqui foram aceitas. Questões processuais sem qualquer prejuízo ao julgamento. Em todos os casos o dolo eventual é um fato inquestionável, mas aqui ainda mortes acontecem causadas por pessoas que assumem o risco à vida. Ainda aqui consideram como crime culposo, sem intenção e no máximo responsáveis pelas mortes pagam com serviços sociais.

O julgamento do caso Kiss foi um ponto de virada nessa absurda interpretação da lei. Mas ainda a insensíbilidade e burocracia cega que não dá resposta ao fato em si, que é um crime hediondo no sentido da Humanidade. O Sistema judiciario por esses membros tratou o caso como um crime financeiro ou algo assim. Um crime como se não houvesse mortes e feridos e na magnitude que isso aconteceu e o que deve ser dado como resposta à sociedade.

Desembargadores do tribunal de justiça do RS após 7 meses anularam o julgamento por questões processuais irrelevantes em que nada prejudicaram a decisão dos jurados que condenaram os 4 réus. Depois de 10 anos , dez dias do mais longo julgamento da história, desembargadores em menos de 4 horas decidiram por 2×1 anular julgamento. O voto discordando e a manifestação do juiz do júri mostram que se assim se considerar todos os juris (anteriores) deveriam ser anulados. Não se trata de insensibilidade somente com a questao humana, do sofrimento descabido vindo do poder judiciário, mas da insensibilidade a que se presta a justiça à resposta ao direito, esse que está acima de todos. Para isso que existe a justiça e as leis.

Vidas são perdidas todos os anos porque o exemplo que deveria vir do poder público é vagaroso, leniente. Por receio e por conscientização se inibe futuros crimes e futuros criminosos. Não podem ser levados a serem cúmplices de futuras tragédias, queiram ou não é isso que acontece pela falta de receio, da falta de exemplo.

É a punição que salva vidas no futuro quando se pune motoristas embriagados que assumem o risco, proprietários que superlotam,
músicos que por ganância arriscam á vida alheia, que fogem e não alertam. Onde mineradoras por ganância sabem dos riscos e até calculam o prejuízo caso ocorram rompimento, onde se deixa jovens atletas ainda menores de idade à guarda de clubes alojados em locais inseguros, onde ainda tantos crimes acabam prescrevendo por imorais apelos, papeladas e papeladas que obstruem, mas que poderiam ser rejeitadas, onde enfim, o juramento feitos pela moral e ética de toda a magistratura aconteçam e não mais se aceite os desvios que destroem famílias e matam inocentes que confiaram no Sistema. Esse sistema que ao contrário, pune a quem o denuncia por suas falhas e omissões.

Justiça e não vingança é feita quando se julga em tribunais e se respeita a decisão soberana da população ali representada.Vingança seria voltar a lei do Talião, da retaliação, do olho por olho, dente por dente.

Não se pode mais aceitar que membros da magistratura por decisões descompromissadas com o resultado soberano contribuam a perpetuar a impunidade.

Paulo Carvalho, pai de vítima e diretor da AVTSM, defende séries sobre a tragédia na boate Kiss. Foto: divulgação. 

 

Paulo Carvalho

Diretor jurídico da AVTSM – Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de SM. Pai do Rafael Carvalho uma das 242 vítimas da tragédia na boate Kiss.

 

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