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10 poemas de Mano Mello

ANFITRITE

Anfitrite, mãe de Tritão
E esposa do deus Netuno,
Só estava com Netuno
Por mania de querer
Ser deusa.
Jamais conseguirá.
Se conseguir,
Coitado do deus Netuno,
Vai levar uma bruta queda
E quebrar seus tridentes.
Quando a ficha caiu,
E ela percebeu que jamais seria
Uma deusa,
Entediou com o Senhor dos Mares,
Que era um velhote resmungão.
Fugiu do Olimpo
E assumiu sua essência humana.
Hoje vende pencas de banana
E sexo com mel e agrião
Nas esquinas decadentes
De Copacabana

CUS

O Juiz da CUra gay,
(Diz-que o nome é Moro,
Mas não faço coro),
Cortou os CUs de CUritiba,
CUiabá
E Cubatão.
Exportou tudo pra CUraçau…
CUritiba ficou Ritiba,
Que em tupi quer dizer do mundo.
CUiabá ficou Iabá,
Que em iorubá
Quer dizer da mãe.
Cubatão ficou Batão,
Que em paulistês
Quer dizer da tia.
CUraçau ficou com quatro
CUs.
Em CUraçalês:
CUCUCUCUraçau.
CUCUruCUCU, Paloma,
Que fartura de CUs!
Uau!!!!

BRINCANDO DE SER

Na Biblioteca de Alexandria,
achei a Pedra Filosofal,
que os alquimistas procuram
e nunca acharão.
Com ela,
desvendei o segredo da juventude eterna
e a fonte da sabedoria.
Testemunha viva da história humana,
de vez em quando mudo de personagem.
Fui Pessoa, Hesse, Shakespeare, Dante e Lima Barreto,
por amar a literatura.
Quando me cansa a vida eterna,
me escondo,
hiberno por séculos.
Ou me transformo em água e fico fluindo.
Já fui o Rio Nilo, o Jaguaribe,
o São Francisco e o Amazonas.
Hoje brinco de ser Mano Melo.

CALAMIDADE JONES

A bela Calamidade Jones
Me escolheu para amante,
Me declarou a bola da vez
De entrar na sua caçapa.
Ela não é nenhuma Giselle Bundchen,
Mas é do mesmo jaez.
E além de bela é dotada de rara sensatez.
Também não sou nenhum Mick Jagger
E há muito passei da fase
De dar dez sem tirar de dentro.
( Agora só dou nove).

Ela faz parte da APA –
Associação de Proteção aos animais,
Cujo logotipo é um jumento
Coroado como o Rei dos Irracionais
Vertebrados e invertebrados.
Escutei a voz de Deus num poço tapado,
E trepado num pé de manga,
O brado retumbante da tribo Xavante
Ás margens plácidas do Ipiranga.
Um pajé Jesus de maracá e tanga
Montou numa anta
E trilou o apito
Que mulher de branco lhe deu no carnaval.
Querendo exorcisar o fogo do mal,
Sufocou na garganta
O horror do grito,
Ao ver os bichos e as árvores morrerem queimadas
Nas fogueiras do Thomás de Torquemada.
E desse inferno de Dante
Não escapou nem grilo falante.
E porque que a Calamidade Jones
Pulou assim do nada para a aquarela
Dessa história que não é dela?
Foi por ser protetora dos insetos e bichos de pena,
Do direito ao cio das gatas e das cadelas,
E dos direitos civis dos cavalos e éguas aladas?
Não foi assim nem nada.
É que se arrependeu da palavra dada
E desistiu de ser minha namorada
Que eu amava tanto.
Chorei lágrimas de crocodilo
E afoguei em meu pranto
Pirâmides e esfinges do rio Nilo.
E fi-lo porque qui-lo.

ALTERNATIVAS PARA UMA ARTE NATIVA

Nativifique-se,
Ou perca sua identidade,
Ou esqueça de você.
Nativifique-se.
Sem xenofobias e sem paranóias,
Mas nativifique-se.
Arte nasce das origens.
Criação começa nos gens.
Não se batize na pia
Da mesmice geral,
A cópia será sempre uma cópia,
E original será sempre original.
Chega de gurus.
Todos os gurus
Viraram cuscus.
As divindades ruíram,
Não se mostraram mais que simplesmente humanos.
Como nós.
A UNE não uniu a nossa voz.
As influencias são afluentes de um rio maior,
Nossa própria criação.
E viva a diversidade,
Viva o rap e o rock,
Viva o samba e a canção!

Nós é que somos a síntese
Que vai parir outras teses e antíteses.

Não nos deixemos seduzir pelos monopólios
E pela monocultura artística
Que só tem espaço para o óbvio.
Reforma agrária cultural já!
Todas as formas e todas as manifestações
Fazem por merecer seu lote.
Beba sua sede sem quebrar o pote.
O mundo é vasto,
Habitado por muitos rostos
Com muitas várzeas e muitos pastos.
Lima Barreto é grande.
Machado de Assis também.

Poesia não é tédio,
Dança não é chilique,
Música não é ruído,
Teatro não é boutique,
Cinema não é bordel,
Merda não é tinta,
Dedo não é pincel.
Pense sobre isso:
Você é seu principal compromisso.
Ou então,
Pegue seu violão
E vá viver sua vida com outro bem,
Que já cansei de pra você não ser vintém.

O CÍRCULO SE FECHA

Foi dado um novo passo
Em direção ao abismo.
Cada qual cuide bem de si mesmo,
Que tá foda.
E isso não é cantiga de roda,
Nem disputa de queda de braço.
Tenho medo
Da destruição da Terra.
Tenho medo
Do naufrágio do barco a vela
E que inventem uma guerra
Contra a Venezuela.
Tenho medo
Que decretem que todo cavalo
É mula.
Tenho medo
Eles prenderam o Lula
E a favela invadiu o asfalto.
Tenho medo dos que serão esmagados
Pelas botas de salto.
Tenho medo que pisem no meu calo,
Tenho medo
Do bote da cobra naja
Tenho medo
Da fúria dos exaltados
E de intervenções
Em outros Estados.
Tenho medo de que isto
Seja só o começo.
Tenho medo
Da beata que reza o terço,
Do miserável evangélico
Que sonha em ficar rico,
Dos bandos formando bonde,
Do monstro adormecido que desperta
E se ergue.
Cada qual sabe onde o sapato lhe aperta.
Tenho medo do que se esconde
Detrás da ponta do iceberg.
Tenho medo.
Tenho medo.
Quem tem cu tem.
Eu tenho.
Tenho medo

RILKEANA

A vida tem razão em todos os casos.
A vida tem razão em todos os acasos.
A vida tem razão em todos os ocasos.
A vida tem razão.

PESCARIA

Eu vou fazer iscas
Das minhocas em sua cabeça
Pra pescar peixes de açúcar
No teu lago de lágrimas

Também, meu bem,
Meu jasmim
Fazer a mim pergunta tão complicada
Que nem na ciência aplicada
Se encontra resposta?
Mas que pergunta mais bosta.
Sobre a existência
De sã consciência,
Não sei responder.
Acho que existir
É viver.
Ou vice versa,
Quem pode saber?

Pra que pergunta ao Tempo
Sem tempo de responder,
O que só será tempo
No tempo de acontecer?
O profeta falou que não se importa
Nem com a razão torta,
Quanto mais se ela é pura ou prática.
Ou seja:
É mais fácil um camelo
Passar pelo fundo de uma agulha
Que um caga-regras
Sair do reino dos pulhas.

ORAÇÃO

Amem.
Amém.

 

     EM BREVE NA REDE SINA SHOW DE POESIA ONLINE COM MANO MELLO.

AGUARDE!

 

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MANO MELO
Poeta e ator, roteirista para cinema e vídeo. Desde 1979, quando retornou ao Brasil após viajar por dez anos através do mundo (América Latina, Europa, Ásia e África), tem interpretado seus poemas em teatros, bares, centros culturais, universidades, escolas, eventos e congressos literários, até mesmo praças e praias, no Rio de Janeiro e muitas outras cidades. Foi narrador do Rock Sinfonico, a História do Rock and Roll, com a Orquestra Sinfônica Brasileira, no Teatro Riachuelo, RJ. Em novembro estará na Mostra Cultural do Cariri, fazendo shows em Juazeiro do Norte e Crato.
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