VERGONHA ALHEIA 2: De cara com o “bom” e velho racismo. São Paulo, Fran’s Bar, esquina da Caramuru com Pageú , Saúde, sexta feira à noite. Eu e meu filho procurávamos um lugar para assistir à final da NBA e, por sorte ( ou azar), encontramos. Um bar confortável, chopp gelado , som agradável e o que mais queríamos , um telão com transmissão do jogo. Sentamos logo abaixo do telão , ao nosso lado 04 jovens, três homens e uma mulher, com não mais que 16 anos, todos eufóricos torcendo para o Cavaliers. Praticamente um jogo de negros contra negros valendo alguns milhões de dólares para enriquecer sobretudo os brancos. Ídolos negros, platéia branca . Fim do primeiro quarto, os jovens se reúnem em torno de um celular e lêem em voz alta uma série de piadas sobre judeus, risadas e contentamento de todos. Em seguida, um deles saca o celular e fala: _ei! Eu tenho umas piadas de negros aqui…e começa a série com coisas do tipo ” Qual a diferença entre um negro e …”. Risadas! Escárnio! E sobre suas cabeças jogavam seus ídolos negros. Imediatamente eu e meu filho nos entre olhamos, eu não conseguia parar de olhar para o grupinho racista. Um olhar fixo carregado de fúria, peguei um celular e fiz várias fotos, minha vontade era a de socar literalmente a cara deles! Não fiz, fiquei na vontade e nas fotos. Carrego essa culpa. Poderia ter levantado e falado com eles, meu filho não deixou. Meu olhar fixo e as fotos fizeram com que se calassem . Dois deles se levantaram e saíram do bar, muitas pessoas os cumprimentaram no caminho. Eram de casa. Me levantei e fui atrás pra “policiar ” mesmo, continuei com meu olhar fixo. Eles me olhavam com medo. Ficaram fora do bar até o final do jogo… O Cavaliers ganhou, nós perdemos! A impotência amarga em meu peito!
MARCELO VALLE
É fotógrafo, comunicador e deseducador. Mestre em Comunicação, na linha de pesquisa em Mídia, Cultura e Produção de sentido. Desde 2000 trabalha em diferentes projetos sociais em comunidades de baixa renda, tanto na área rural quanto urbana. Participou de diferentes projetos centrados nas possibilidades e usos de diversas mídias (vídeos, cinema, fotografia, jornais e rádio) nos processos de aprendizado, unindo comunicação e educação, incluindo uma interação e troca de conhecimentos com profissionais de diferentes áreas, psicólogos, antropólogos, cientistas sociais, educadores, cineastas, para elaboração de conteúdo, metodologias e formas de avaliação. Atualmente coordena o Núcleo de Cultura, Ciência e Saúde do Instituto Nise da Silveira no Engenho de Dentro, Rio de Janeiro.