Hoje ela faria 114 anos. E sempre acho curioso e um pouco limitado quando começa a cantilena de “desconstruir” Simone.
“Ela tinha ciúme” “ela era submissa ao Sartre” “Ela correu atrás do Algreen feito uma cachorra”.
Pois é né minha gente. Não é porque ela é uma intelectual que ela não ama, não sofre, não mete os pés pelas mãos.
Fico sempre surpresa com esse consenso atual que mulheres devem ser infalíveis para serem feministas. Observar, teorizar e combater opressão não quer dizer que você não esteja vulnerável a ela, nem que seja um robô sem sentimentos e que vai tomar suas decisões afetivas levando em conta a correção política e ignorando os efeitos devastadores da paixão.
Vejo mulheres muito jovens achando que o feminismo é uma doutrina de correção comportamental e sexual para mulheres. Quem espera isso deveria procurar uma igreja, e não uma luta política.
A contradição e os lugares insondáveis do coração fazem parte da humanidade de qualquer um. Exigir perfeição, contenção e assepsia emocional de mulheres para validar sua produção artística, científica ou política é muito cruel.
Simone viveu, pode viver, e experimentar e transformar o mundo pois se deu ao direito de arriscar. E sem risco, queridas, não há revolução possível.
Renata Corrêa
é roteirista, escritora, dramaturga. Com forte presença nas redes sociais, seus trabalhos têm foco no humor e no protagonismo feminino. Autora do livro Vaca e Outras Moças de Família (Ed. Patuá), e da peça A Fábrica de Cachorros, e do documentário Clandestinas, sobre aborto no Brasil. É colunista no Splash (UOL) e colabora para diversas publicações como Marie Claire e Jornal O Globo. Apresenta com Carla Lemos o Podcast Primas, sobre cultura produzida por mulheres e a série de vídeos Como Não Ser Um Machista Babaca. Escreveu as séries Perrengue (MTV/Globoplay) e foi roteirista dos programas Greg News (HBO), Adnight, Tá no Ar, Mulheres Fantásticas e Fora de Hora, todos da Rede Globo, de onde é atualmente contratada.
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