Um “continho” de Tânia Lopes
A mulher caminhava desanimada, com os braços ao longo do corpo mal agasalhado, e o frio gelava até a alma.
Nada de emprego, nada de esperança, nem luz nos olhos. E nada quente que lhe aplacasse a fome e a sede de um café. Passadas em lento compasso.
O homem, passos apressados, olhos acesos olhando a bolsa dela.
Saíra recém do presídio. “Punguista”…
E ele não via rumo ou lugar nenhum nem de ida nem de chegada… E também tinha fome.
Antes, fome de liberdade, agora, fome de vida.
O frio aumentara. A mulher abraçou a si mesma, tropeçou e caiu.
Ele acudiu, num gesto antes impensado. Seus olhos se encontraram e baixaram encabulados…
Numa folha de jornal que o vento carregara e jogara entre os dois, um recado do destino, uma frase em letras garrafais:
-Não deixe a vida esfriar!
Uma propaganda de café.
Seguiram juntos e ela falou:
– Ainda tenho um pouco de pó desse café!
Tânia Lopes é escritora e artista plástica. Foi patrona da Feira do Livro de Santa Maria, em 2004