A Rede Sina tem conversado com o professor, contista e romancista Menalton Braff que disponibilizou para publicação um fragmento de seu livro “Além do Rio dos Sinos”, da editora Reformatório, que em 2020 levou prêmio Machado de Assis, para romance, da Biblioteca Nacional. No vídeo acima o autor fala à série “Ler o mundo” que o Blog do Grupo Editorial Global realizou com alguns de seus autores refletindo sobre a leitura e a literatura.
Confira um trecho de “Além do Rio dos Sinos” e conheça mais o autor. :
“− Tu vai começar tudo de novo?!
Em sua voz trovejam ameaças de quem tem o futuro preso entre os dedos, senhor dos destinos.
Florinda demora-se um pouco para responder. “Tudo”, uma palavra tão ampla quanto vazia, ela agora vai preenchendo com as brigas do casal, sua recusa de sair aventurando-se por aí para seguir um marido, suas várias recusas, todas muito enfáticas, de se mudar para o alto de um morro apenas conhecido pelas descrições de Nicanor, imaginado como um inferno rente ao céu pela dureza das palavras com que o marido se dirigia ao lugar onde tinha nascido. Ela sente raiva na pergunta do marido e lhe devolve em ressentimento, além de uma vontade imensa de agredi-lo, sua resposta. Começar o quê? A sensação de estar sendo arrastada por esta mão bruta pelo barro da estrada lodosa sem qualquer possibilidade de retorno, como uma praga, um castigo, com destino marcado, essa sensação, desde a morte do pai, jamais deixara de sentir. Se estava pagando por atos passados, continuaria a pagar até a última gota de vida. Para tanto estava com o coração petrificado.
− E a pior coisa é essa asnice de achar que eu estou chorando. Já chorei tudo que tinha de chorar. Deixei minhas lágrimas na terra que foi do meu pai. Agora a fonte secou. Nunca mais tu não vai ver lágrima descendo pelo meu rosto. Então não vê que foi a chuva que me molhou? Por que tanta asnice assim?
A voz de Florinda sobe como do estômago por canal apertado e áspero e não sai pela boca, mas da boca vai caindo aos pedaços. “
Sinopse:
O novo romance de Menalton Braff, revela um Brasil profundo, obscuro, esquecido, ignorado pelos viventes das grandes cidades, cuja trepidação fremente invade os noticiários televisivos, que sobrevivem de tragédias e sangue.
O espaço onde se desenrola o enredo é o Vale do Rio dos Sinos, lugar em que se dá o embate morro x várzea, cerne dos conflitos dessa narrativa prenhe de infortúnios silenciosos, não menos trágicos, todavia, do que aqueles que estampam as primeiras páginas dos jornais.
A luta inglória dos solitários habitantes do morro infértil, cravado de pedras, e o sonho de habitar a várzea, menos inóspita àqueles que tiram da terra a sobrevivência, permeiam a vida dos protagonistas – Nicanor e Florinda. Ele, órfão ainda jovem, nenhum estudo, ambicioso, fraco, dono do Morro do Caipora, que herdou da família morta, submete-se ao assédio e ao poder dos mais ricos; ela, filha de fazendeiro, órfã de mãe, encarna força e coragem para quebrar tradições morais e sociais, apesar de viver num mundo patriarcal.
Estruturado em dois planos temporais, da Segunda Guerra Mundial à Ditadura Militar do Brasil, passado e presente correm paralelos até convergirem numa única estrada que leva o leitor a desbravar os mesmos caminhos e percalços trilhados por Florinda e Nicanor: as agruras da natureza, a criação dos filhos, o contato diário (quase humano) com os animais.
Nesse Vale perdido no mapa e no tempo, o autor constrói um microcosmo no qual o leitor mergulha embalado pela oralidade e poeticidade da linguagem: podem-se ouvir o uivo do vento no morro e o som cantante das pedras do Rio dos Sinos.
Amor, ódio, traição, vingança, rancor e morte são temas candentes que se articulam – trágica e poeticamente – neste Além do Rio dos Sinos, de onde desponta, sobretudo, a força de uma mulher que ousou comandar sozinha a rédea de seu destino.
Um pouco da história do autor…
Menalton Braff nasceu em Taquara-RS. Em 1965 viu-se na contingência de abandonar a Universidade, em Porto Alegre, transferindo-se para São Paulo, onde mais tarde concluiu o curso de Letras, na Universidade São Judas Tadeu, na qual também se iniciou no magistério superior. Vive atualmente em Serrana, pequena cidade na região de Ribeirão Preto, por ser um lugar em que consegue fechar os olhos e deixar solta a imaginação. Todo seu tempo, hoje, é dedicado à Literatura (escrita, leitura, ensaios, crônicas).
O início de sua carreira deu-se em 1974 com a publicação de um conto na coleção Contos Jovens nº 4, da Editora Brasiliense.
Tem dois livros publicados (Janela aberta – romance – e Na força de mulher- contos), ambos pela Editora Seiva e mais 25 títulos por diversas editoras.
Em 1999, a Editora Palavra Mágica, de Ribeirão Preto, publicou sua coletânea de contos À sombra do cipreste, com que conquistou o Prêmio Jabuti 2000 – livro de ficção do ano. Essa coletânea foi adquirida pelo governo do estado de São Paulo e pelo governo do estado do Paraná. Em 201l a Editora Global lançou a 6ª edição do mesmo. Em 2012 ele foi selecionado para o Programa Apoio ao Saber, da Secretaria da Educação de São Paulo, para fazer parte do kit literatura para alunos do 2º ano do Ensino Médio (cerca de 293.000 exemplares). Em 2000 a mesma Editora Palavra Mágica editou o romance Que enchente me carrega?.
Em 2002, foi editado pela Nova Fronteira o romance Castelos de papel (finalista da Jornada de Passo Fundo de 2003). No mesmo ano, viu publicada sua primeira novela juvenil, A esperança por um fio, pela Editora Ática. Seguiram-se em 2004 o romance Na teia do sol, publicado pela Editora Planeta, e Como peixe no aquário, outra novela juvenil, pela Edições SM. Por essa mesma editora, no ano seguinte, 2005, saiu Gambito, um livro infantil que constou do Catálogo de Bologna de 2006.
Em 2006, a Bertrand Brasil lançou nova coletânea de contos, A coleira no pescoço, com a qual foi finalista do Prêmio Jabuti-2007, e, pela mesma editora, foi lançado nesse mesmo ano de 2007, o romance A muralha de Adriano, selecionado para concorrer ao Prêmio Portugal Telecom, finalista do Jabuti 2008, finalista do I Prêmio São Paulo de Literatura, e menção honrosa do Prêmio Casa de las Américas (La Habana), em 2009.
No ano de 2008, a Editora Ática lançou sua quarta obra infantojuvenil, o romance juvenil Antes da meia-noite.
- Depois de 2010, já foram lançados Moça com chapéu de palha, pela Editora Língua Geral, Copo vazio e No fundo do quintal, dois romances juvenis pela FTD, além de Mirinda, pela editora Moderna e Bolero de Ravel, pela Editora Global. Esses quatro últimos publicados em 2011. Copo vazio foi adquirido pelo PNBE; e Bolero de Ravel foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura 2011, e semifinalista do Prêmio Portugal Telecom 2011. Ainda em 2011 a Global Editora lançou o romance Tapete de silêncio, semifinalista do Prêmio Portugal Telecom e finalista do Jabuti de 2012. Em 2012 a Editora Bertrand Brasil lançou seu romance O casarão da rua do Rosário, e em 2014 O fantasma da segundona, um romance juvenil, foi editado pela FTD. Seguiram-se Pouso do Sossego (2014, romance, Global)
- Castelo de areia (2015, novela juvenil, Moderna)
- O peso da gravata (2016, contos, Primavera)
- Noite Adentro (2017, romance, Global)
- Amor passageiro (2018, contos, Reformatório)
- Além do rio dos Sinos (2020, romance, Reformatório)
Organizou Oficinas de Contos para a Secretaria da Cultura, de Ribeirão Preto, para o Sesc, da mesma cidade, para a Secult, de Belém do Pará, e para a Oficina Cultural Cândido Portinari várias vezes.
Tem participado de Salões de Idéias de Feiras e Bienais do livro como as de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Bauru, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Sertãozinho, São Joaquim da Barra, Ituverava, Sales Oliveira, Belém do Pará , Guarulhos, Belo Horizonte, na qualidade de autor convidado. Vem proferindo palestras em escolas públicas e particulares, bem como no SESC, unidades de Ribeirão Preto, Bauru, Piracicaba, Araraquara, São Carlos e Catanduva. Participou do projeto estadual Viagem Literária, da Secretaria da Cultura de São Paulo em todas as suas edições até a oitava e, recentemente, participou da Caravana de Escritores (projeto da FBN) em Peruíbe-SP. Em 2020 foi agraciado com o prêmio Machado de Assis, para romance, da Biblioteca Nacional com o romance Além do Rio dos Sinos.
Casado com a profa. Dra. Roseli D. Braff , tem seu tempo dedicado à Literatura (escrita e leitura) além da participação de eventos em que a Literatura seja o assunto principal