No mês da Consciência Negra, inicio a minha Coluna Palavras Retintas na Rede Sina.
A data teve origem aqui no Rio Grande do Sul, quando um grupo de jovens ativistas negros, o Grupo Palmares, começou a pensar em uma data que realmente fosse significativa e representativa para a população negra brasileira. O treze de maio não nos representava; o dia da morte de Zumbi dos Palmares, vinte de novembro, foi a escolhida. Em 2021, o vinte de novembro completa cinquenta anos de celebração. Resistência, luta e reflexão tornaram-se sinônimos do mês.
É por esse motivo que escolhi o livro “Meia- Siza: Ignácia & Aramis- Mãe e filho na luta pela sobrevivência no pós- abolição”, da escritora gaúcha Marieta dos Santos da Silveira, Editora Pradense, 2020, para escrever essa coluna.
O livro retrata memórias de uma população que foi objeto de compra e venda; com grande ganho por parte do governo através do imposto gerado na negociação, que se chamava “meia- siza”.
Entre as experiências vivenciadas pela família de Marieta são recordados aspectos históricos, geográficos e sociais do período pós- abolição.
Centralizado nas vivências de Ignácia, avó de Marieta, e de Aramis, pai de Marieta, abre-se uma cortina de lembranças coletivas da população negra, com o relato de experiências, crenças, valores, posturas e comprometimentos.
Uma história repleta de resistência, luta e reflexão, mãe e filho, lutando pela sobrevivência em um mar de doze milhões de africanos que foram raptados, subjugados, massacrados, invisibilizados, roubados e violentados diante do que permeava a sua humanidade. Ficaram sem história, sem identidade, sem sobrenome e tiveram que se reinventar em uma terra repleta de violências cotidianas.
Marieta resolveu contar essa história apagada dos livros oficiais: buscou familiares, cartórios, jornais, artigos e, assim, recebemos esse presente.
O livro é muito mais do que contar a história de Aldina, bisavó de Marieta, escrava comprada por um conto e duzentos mil réis, ou ainda de Ignácia, sua avó, mulher negra que criou sozinha o filho Aramis, pai de Marieta, ou então a trajetória do livro azul de Aramis. É a história não registrada de vidas negras em um país criado e mantido pelo racismo estrutural.
De forma leve e certeira, o livro encanta pela capacidade de nos trazer essas vidas negras com humanidade.
Livro:
Meia- Siza: Ignácia & Aramis- Mãe e filho na luta pela sobrevivência no pós-abolição
Silveira, Marieta dos Santos
Porto Alegre: Pradense,2020
143 p. 13 x 20 cm
ISBN: 978-65-88935-01-9
Ensaio Biográfico
Lilian Rocha é natural de Porto Alegre-RS.
É Analista clínica, musicista e escritora. Autora dos livros: A Vida Pulsa-Poesias e Reflexões, Negra Soul e Menina de Tranças. Coautora dos livros: Leli da Silva: Memórias- Importância da História Oral e Travessias de Amanaã. Patrona da Feira do Livro de Canoas/RS de 2021.