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Cheio de letras minúsculas, por Felipe Freitag

Aí a gente toma uma ceva (daquelas mais baratas porque a vida não é fácil) com uma amiga em uma praça e então a gente vai tecendo, tecendo, tecendo. E os fios da vida vão dando nós. E nós desatamos, ou ao menos tentamos.

E nesse fluxo incessante de pensar e de ser e de tentar e de buscar e de internalizar e de jogar fora, a gente descobre que cada um costura de um jeito e que, às vezes, as linhas são paralelas e outras vezes elas bifurcam-se em um sem fim de ataduras.

E aí entendemos que caminhos são para isso: para serem tortos. Tortos como sempre foram as nossas pernas diante de raízes de árvores grandes no meio do caminho. E tem a pedra do Drummond e tem a gente sempre tropeçando. Pândegos!

E, naquela praça onde estávamos a menos de uma hora, trafegavam pessoas e histórias, e as nossas histórias, também, um dia, quem sabe, podem vir a ser ouvidas. Sim, porque temos histórias para contar, todavia somos dos que preferem ter histórias para ouvir. E meio zonzos (porque cerveja dá aquela tontura de olhos meio fechados) acreditamos no futuro, acreditamos nas pessoas enviesadas, nas que são tortas na vida. “Vai, Carlos! Ser gauche na vida.”

E agora o que importa são os restos de nós mesmos. Esses restos de palavras ditas que a maioria das pessoas esquece ter dito. Livrai-nos das palavras ditas e esquecidas. Amém. E o que importa é o Sorriso da praça, no seu vai e vem de encontros e desencontros. E o que importa é esse vento quente que atiça nossas almas mais do que nossos corpos. E o que importa, afinal, somos nós e os outros em uma roda viva de vida que flui e que traz e que leva e que queremos que permaneça.

E importa eu não me preocupar com a pontuação desse texto, porque desejo o mais escondido, o mais fundo de mim sendo expelido sem amarras. E se acaso cada ser humano for um texto sendo escrito? Uma vez li em um texto do meu escritor preferido que a sua vida não daria um romance. Acho que a minha e a dela, também, não dariam. Mas um conto, sim.

Seria um nocaute cortazariano. E as luzinhas de Natal começam a filtrar minhas pupilas. Nem tudo está perdido quando se é história viva. E história viva, perdoem-me os intelectuais, só se faz, entre outras coisas, em uma conversa amiga em uma praça tomando cerveja. Vivemos e não somos pontos finais. Reticências são nossas rotas. E as notas musicais que seguimos no dia de hoje têm um ritmo de blues.

E Leminski sussurra em nossos ouvidos: “que faço parte dessa gente que pensa que a rua é a parte principal da cidade.” Habitamo-nos em um farfalhar de arco-íris.

 

FELIPE FREITAG é graduado em Letras Português e respectivas literaturas (licenciatura) pela UFSM e é mestre em Estudos Linguísticos pela mesma instituição. Professor a mais de dez anos, dedica-se, também, à escrita literária. Autor, em parceria com o Professor Pós-Dr. Marcos Gustavo Richter, do e-book Formato de curso storyline e ensino linguoliterário no Ensino Médio: as tomadas de decisão paradigmatizadas do profissional docente.

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