1.
A floresta tombeia enquanto o índio arregala os olhos
E se afasta
Do homem ouro – serra – bala
Com fome de grana.
Os bichos fritos por chamas
E no rio de mercúrio os peixes suspiram o último gole de piedade.
Por ali até mosquito fica sem rumo.
Nas malocas a desonra das índias meninas.
E,
Para as crianças,
A poesia com esperança
Sai de cena
E
Pena.
2.
Não é trança nos cabelos
É dressa com palha úmida
Respingos,
Mãos, dedos e boca.
Quanto maior o rolo
Menos boca.
O ápice da visita das dresseiras era o café da tarde.
3.
Não é que na guria
Ainda havia
Olhos de peixes vivos nos cestos.
Precisava de uma força descomunal
Para saltar na água
E ser sereia.
4.
Hoje acordei para lhe dizer foi isto: Marcele.
Tudo o que vivi com você me levou a um dia ensolarado do seu lado
A chupar gomos de bergamota que nunca apreciei.
Nunca lhe falei isso,
Mas digo agora.
Muitos anos morreram, desde o dia daquele céu,
Em que nuvem nenhuma se opunha entre o Sol e a Terra.
Marcele, em que lugar vigia sua vida agora?
Sei que os pés de bergamotas morreram, o campo se estendeu.
E o que nos restou foi ausência,
Receio,
Mudanças.
Não sei bem transfigurar o momento que vivemos,
Porém bate como um vento nervoso
E eu estou aqui a remoê-lo.
5.
Você não me disse que havia um Tribunal para me julgar aqui na Terra,
Só me disse que haveria sempre uma flor quando eu abrisse as malditas portas,
Agora não importa, nem mais valor dou pras portas,
Já abri e fechei às que me flecharam.
Você só colocou possibilidades boas na minha mente.
Eu acreditei por tanto tempo nisso.
Até que o tempo veio
E num dia feio
Você me contou que Papai Noel era o pai.
6.
Grã amiga,
Lembro-me dos quinze
Quando me abandonou
Porque eu estava bêbada.
Na indignação
Quebrei a sua taça pra sempre.
Distantes, sabemos
Que a vida nem sempre é uma donzela adormecida
Esperando o beijo da sacanagem.
7.
Vê-lo pensador sozinho
Nas tristezas das coisas do passado que as teve.
E eu não estava lá,
Nem você em mim
Para um desabafo, um beijo, um abraço,
Um consolo, um pecado.
8.
No encontro o frio era intenso
E o vento Minuano se infiltrava muito além da nossa pele.
Na esquina,
Sem importância
Fumávamos e congelávamos palavras.
Aos olhos dos outros aparência.
9.
No bar ela cambaleava
Batia mesas
Cadeiras.
No seu corpo lindo
O casaco preto dançava
Como cortina com vento.
Sofria de amor
Alguém lhe dissera que era só seu.
Sei, já bebi assim,
Esses homens nos quebram no tronco.
Caiu
Adormeceu no vazio da mesa
Com rosto de anjo morto.
10.
Escrever é
Indício de sair para
Outros lugares.
Solidão
Penhasco vivo.
Vento fresco
Ou
Vento que assovia
Num sobrado de lembranças.
É medo que o poema
Se feche com a porta
E não se lembre de voltar.
Escrever é silêncio de não dizer tudo.
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Izabel Pedron Larentis (IZZAP.)
Nasceu em Protásio Alves/RS. Hoje reside em Bento Gonçalves/RS. Graduada em Letras e pós-graduada em Estrutura e Formação das Palavras e em Linguística. Atuou como professora de Língua Portuguesa e Literatura. Em 2021 lançou seu primeiro livro de poemas “alter ego” (ed. Viseu). Os poemas abaixo são do segundo livro da autora, TRASNBORDANDO (ed. da Autora. Financiamento Fundo Municipal de Cultura de Bento Gonçalves), que será lançado em outubro de 2023.