Elena e Irina
(Raul Maxwell/Marcelo Schmidt)
Elena, de Moscou, é dançarina
Irina é também
Elena já beijou a esfinge
Irina finge muito bem
E gozando de mim
Irina ri na minha cara parva
De quem só lavra a palavra
Elena adora minha rima rara
Irina engana de passista
Elena já desfilou no Rio
E ao desfile querem que eu assista
Eu rio e espio as sambistas que vieram do frio
Elena é felina e sagaz
Irina é ferina e mordaz
Morde os meus lábios
Entre os beijos que me traz
Elena é uma princesa
Tipo a xará de Tróia
Irina é uma Rainha má
Desperta minhas paranoias
Elena é muito nova
Irina nem é tão menina
Partiram ontem pra Moscou
É russa e é ruça a minha sina
Criatura de Babel
(Raul Maxwell/Renato Mirailh)
Um esplendor, um ex-amor
Um escarcéu
Quem me escuta é foragida
Do pinel
Uma figura da literatura
De cordel
Uma vez só, um pão-de-ló
Lua-de-mel
Tem ancestrais em Java
E ascendente escorpião
Em suas veias correm sangue e lava
No ventre eu danço em um vulcão
É uma bruxa de Sabá
Que me enfeitiçou
Não me tirou pra Barrabás
E me crucificou
É dona-prima, bailarina
De um teatro de papel
E me depena que dá pena
Vendeu todo o meu céu
Anestesia minha ira
Canforeira do Bornéu
Me xinga em javanês
Me ama em francês
Em outras línguas
A confusa criatura de Babel
Loucos sem cura
(Raul Maxwell/Renato Mirailh)
Ela é meu céu
Eu seu inferno astral
Ela tem forma
Eu formado no irreal
Ela é coragem
Eu nem imagem
Ela é concreta
Eu nem poeta
Sou abstrato
Por vezes a destrato
Ela tem onde
Eu nem porquê
Ela é de cara
E chega tarde
Eu Viajante
Cedo covarde
Mas nossas noites são boas
Rimos à toa, gozamos juntos
Nossos assuntos, nossas loucuras
Vezes tão puras, vezes tão sujas
Vozes tão roucas, sussurros loucos
Loucos sem cura
Ela é tão livre
Eu tão interno
Ela é moderna
Eu vou de terno
Ela me avassala
Eu a cativo
Num quarto/sala
Dois mortos-vivos
Mas nossas noites são boas
Rimos à toa, gozamos juntos
Nossos assuntos, certas loucuras
Vezes tão puras, vezes tão sujas
Vozes tão roucas, murmúrios loucos
Loucos sem cura
Um blues
(Raul Maxwell/Hélio Augusto)
Eu perguntei
Ao sol nascente
O que é um “blues”?
– Afiada foice
que rasga a noite
e deixa entrar a luz.
E perguntei
Então à lua
O que é um “blues”?
– é um lamento
perdido ao vento
peso de cruz.
Eu perguntei
Ao deus guerreiro
O que é um “blues”?
– Sangue na terra
canto de guerra
é som de obus.
E perguntei
Ao poeta nu
O que é um “blues”?
– Choro de morte
falta de sorte
verso que jamais compus.
E um tocador
De blues me disse
Na encruzilhada:
– O “blues” é a dor
de um cantor
que perde a amada
pois se houver felicidade
um “blues” é nada.
TE PROCURO
(Raul Maxwell/Ângelo Santedícola/Edinho Vilas Boas)
Te procuro em Budapeste
E te vejo no agreste
Do sertão do Ceará
Te procuro entre as estrelas
E, às vezes, quero vê-la
Entre nuvens, pelo ar
Te procuro nas esquinas
No olhar dessas meninas
Que seus corpos vêm mostrar
Te procuro pelos bares
Pelas frestas dos pilares
Escondida a provocar
Te procuro na distância
Que é menor que minha ânsia
De querer te desvendar
Te procuro nas vitrines
Carruagens, limusines
E descalça vou te achar
Te procuro pela rua
Querendo te ver nua
E pudor vou encontrar
Reinvento um cantarejo
E é teu brilho que desejo
Quando a noite vem brincar
Lua não maltrate assim
Lua se achegue pra mim
Por trás de um simples sertanejo
Alguém que ainda te olha e te venera sim
Lua não maltrate assim
Lua se achegue pra mim
No peito desse brasileiro um zabumba chora
Pra te ver sem fim
Invejo
(Raul Maxwell/Ângelo Santedícola/Edinho Vilas Boas)
Invejo os que sentem tremores
E enfeitam com flores o olhar de suas musas
Invejo sua fala confusa
Sua voz sussurrada dizendo te amo
Invejo os que sentem desejo
E ardem num beijo o calor que eles sentem
Nas pernas, no ventre, no peito
Nas mãos tão suadas e gemem te amo
Invejo os que bebem e cantam
E queimam de febre em pleno delírio
Invejo os que fingem poemas
Se fazem poetas e escrevem te amo
Invejo aqueles que choram
Que aflitos imploram, que se ajoelham
Invejo esta dor de navalha
Que corta, estraçalha e deixa sangrando
Invejo os que perdem o sono
Que perdem o senso, que perdem o juízo
Os que alheios a tudo
Alheios a todos, exclamam te amo
Invejo e às vezes eu minto
Que isso eu não sinto e não corro perigo
Eu calo o peito e a garganta
Meu grito é o silêncio, eu te amo e não digo!
Jade
(Raul Maxwell/Renato Mirailh)
Eu só quero roçar no teu colo
Feito o jade de tua gargantilha
Rodear teu pescoço de seda
Como o mar em volta de uma ilha
Pele, pedra, cordão e vestido
Tu não queres o belo contraste
Eu querendo brilhar em tua festa
Tu querendo que eu me afaste
Em teu corpo um colar de pérolas
Com certeza não tenho amanhã
Tu só queres de mim a distância
Superior a de aldebarã
E assim me impedindo de ser
A tua gargantilha de jade
Teu desejo vou satisfazer
Serei um eremita ou abade
Vou me refugiar no mosteiro
Mais distante a adega invadir
Vou beber todo o vinho que houver
E no fogo vou me consumir
Se estivermos juntos
(Raul Maxwell/Renato Mirailh)
Se estivermos juntos
Sob a chuva
Pouco importa
Que o céu desabe
Que o mundo acabe
Em inundação
Se estivermos juntos
Sob o sol mais forte
Pouco importa
Que raios me partam
Ultra violetas
Infra violentos
Como um solo de blues.
Se estivermos juntos
Mesmo em noite escura
Por certo estaremos
Expostos a luz
Pois nos versos que compus
Qual fôssemos a sós
Lá vamos nós
Lá vamos nus
Brincando com fogo
Bancando um jogo
Que a tudo seduz
Bailarina em contraluz
Se estivermos juntos
Pouco importa
A nossa cruz
Pontas de ilusão
(Raul Maxwell/Renato Mirailh)
Há que se ter paciência
Com quem pede conselhos
Sobre o seu amor
Há que se ter consciência
Que se perde a razão
Ao se achar o amor
Pensei em dizer a ela
Que o melhor para a gente
É do amor fugir
Mas sei, quem pede um ombro
Só ouve o que quer
Só vai um caminho seguir
Sabendo, então, que o amante
Um conselho insensato
Precisa escutar
Assim, num vaso sem terra
A semente de uma esperança
Acabei por plantar
Mesmo porque não adianta
Dizer que o amor
Só lhe trará o padecer
Pois quem ama sempre se contenta
Com pontas de ilusão
Compensando o amargo sofrer
IMÃ
(Raul Maxwell/Marcelo Schmidt)
O poema que me veio
Viaja pelo uno verso
Inverso amigo do rei
Verso uno de preguiça
Rima rico
Rima pobre
Rima lindo
Rima feio
Rima da minha laia
Vou-me embora
Vou-me embora pro Himalaia
Que amá-la já está no meio
Vou-me embora
Vou-me embora pro Himalaia
Que a mala já está no meio
Raul Giovani Cezar Maxwell
Nascido em Cacequi RS, no dia 24/09/1962, graduado em Administração pela UFSM, funcionário do Banco do Brasil S.A., compositor/letrista, participante de festivais de música, regionais e nacionais, e concursos de poesia; Coautor em obras coletivas de conto, crônica, poesia e Romance; Patrono da 5ª feira do livro- Cacequi nos trilhos da Leitura – 2014, quando lançou o CD Nos Trilhos da Canção; Coautor dos Livros/CDs Piquenique de Palavras e Baú Brasil Criança, Barquinho de Papel e A Arca de Nina e Timão de literatura pedagógica e infantil; Integrante da Turma do Café.