<\/p>\n
Em s\u00edstole e di\u00e1stole<\/p>\n
Meu cora\u00e7\u00e3o vai e vem<\/p>\n
Expande e retorna<\/p>\n
<\/p>\n
Uso essa imagem muitas vezes<\/p>\n
Pois ela ainda se repete<\/p>\n
Em mim<\/p>\n
<\/p>\n
Feito \u00e1gua-viva<\/p>\n
Em luminesc\u00eancia<\/p>\n
Um pulm\u00e3o<\/p>\n
<\/p>\n
Que recebe e doa<\/p>\n
Que doa e recebe<\/p>\n
Que puxa e repuxa<\/p>\n
<\/p>\n
Algo em mim preso<\/p>\n
N\u00e3o a \u00e1gua-viva<\/p>\n
Que pulsa em bal\u00e9.<\/p>\n
<\/p>\n
\u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n TEMPESTADE NO AMIANTO <\/strong><\/p>\n <\/p>\n Um dia eu vi uma tempestade<\/p>\n De vento se armando<\/p>\n De promessa de chuva<\/p>\n Grossa<\/p>\n <\/p>\n De promessa de gelo<\/p>\n Em blocos<\/p>\n Destruindo carros e<\/p>\n Janelas<\/p>\n <\/p>\n Vi as \u00e1rvores balan\u00e7ando<\/p>\n Entre trovoadas e raios<\/p>\n E o c\u00e9u escurecendo<\/p>\n Como se fosse uma noite<\/p>\n <\/p>\n Um dia eu vi a tempestade<\/p>\n Destruindo o telhado<\/p>\n De minha casa<\/p>\n Machucando<\/p>\n <\/p>\n A cabe\u00e7a de minha m\u00e3e<\/p>\n Um dia eu vi<\/p>\n Ensanguentada<\/p>\n E era p\u00farpura, vermelho<\/p>\n <\/p>\n Vi a tempestade e fui<\/p>\n Para o meio dela<\/p>\n Dizer que eu n\u00e3o tinha<\/p>\n Mais medo.<\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n ADIAMENTO<\/strong><\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n Teremos que deix\u00e1-la para amanh\u00e3<\/p>\n A tristeza<\/p>\n Porque h\u00e1 muito a fazer e quando terminarmos<\/p>\n Haver\u00e1 o que fazer de novo<\/p>\n <\/p>\n Teremos que continuar varrendo para debaixo do tapete<\/p>\n A tristeza<\/p>\n Porque ela paralisa e sentimos<\/p>\n Que ser\u00e1 preciso usar as m\u00e3os<\/p>\n <\/p>\n Teremos que renunciar, fazer de conta que ela n\u00e3o existe<\/p>\n A tristeza<\/p>\n Porque ela \u00e9 desagrad\u00e1vel<\/p>\n E os outros nos esperam<\/p>\n <\/p>\n Teremos que sorrir, afagar, encontrar e dissimular<\/p>\n A tristeza<\/p>\n Porque a alegria \u00e9 a sua prima falsa<\/p>\n E est\u00e1 nos gritando da rua.<\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n DOCE COMO O ALGOD\u00c3O DOCE <\/strong><\/p>\n <\/p>\n O homem do algod\u00e3o doce passa carregado de a\u00e7\u00facar<\/p>\n As cores suaves \u2013 n\u00e3o me importo se s\u00e3o feitas de anilina<\/p>\n Passa e eu sei porque toca a buzina anunciando:<\/p>\n Sou o homem do algod\u00e3o doce e estou passando na sua rua<\/p>\n <\/p>\n N\u00e3o corro pois n\u00e3o tenho mais cinco anos<\/p>\n Nem meu pai est\u00e1 aqui para que eu pe\u00e7a que compre<\/p>\n A nuvem rosa, a nuvem azul, a nuvem amarela<\/p>\n Ou mesmo me dir\u00e1: hoje n\u00e3o posso, filha<\/p>\n <\/p>\n Ou\u00e7o a buzina se afastar e com ela<\/p>\n O homem que talvez n\u00e3o seja doce<\/p>\n O homem que talvez tamb\u00e9m diga a algu\u00e9m:<\/p>\n Hoje n\u00e3o posso, filha.<\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n PASSEIO NA LAGOA<\/strong><\/p>\n <\/p>\n Dia desses um homem disse que<\/p>\n N\u00e3o tem problema as morsas ca\u00edrem<\/p>\n Das montanhas<\/p>\n Que elas v\u00e3o se adaptar at\u00e9<\/p>\n Aprenderem a escalar pedras<\/p>\n <\/p>\n Ele acha que isso pode ser feito em<\/p>\n Dez minutos, dez dias, dez anos<\/p>\n Ele prefere crer que nada \u00e9 afetado<\/p>\n Se ele faz escolhas erradas<\/p>\n Se a necr\u00f3psia dos patos<\/p>\n Revela onde ele joga o pl\u00e1stico.<\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n UM DEUS PARA CHAMAR DE SEU<\/strong><\/p>\n <\/p>\n Eu pe\u00e7o Ele atende<\/p>\n G\u00eanio da l\u00e2mpada<\/p>\n Infinitos desejos<\/p>\n <\/p>\n Passo ora\u00e7\u00e3o no d\u00e9bito<\/p>\n Cr\u00e9dito<\/p>\n Ou boleto banc\u00e1rio<\/p>\n <\/p>\n Eus no comando.<\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n PANFLET\u00c1RIA<\/strong><\/p>\n \u00a0<\/strong><\/p>\n Uma poesia que possa vir em um panfleto<\/p>\n Aquecido pelas m\u00e3os de uma trabalhadora<\/p>\n Que l\u00ea Brecht<\/p>\n <\/p>\n Que possa ser colada nos postes<\/p>\n Como um cartaz<\/p>\n de Vladimir Maiakovski<\/p>\n <\/p>\n E que na ventania das seis horas da tarde<\/p>\n Voe sobre a Esta\u00e7\u00e3o de Metr\u00f4<\/p>\n A ponto de o maquinista perguntar<\/p>\n Quando foi que libertaram os p\u00e1ssaros.<\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n PARAR A M\u00c1QUINA<\/strong><\/p>\n <\/p>\n Trabalho de frente para a janela e fecho as cortinas<\/p>\n A luz promete o que n\u00e3o entrega<\/p>\n Dou a C\u00e9sar o que \u00e9 de C\u00e9sar<\/p>\n Mas tamb\u00e9m preciso de moedas<\/p>\n <\/p>\n \u00c9 minha a teia e agora \u00e9 tarde<\/p>\n N\u00e3o cabe sequer me arrepender<\/p>\n Das ingenuidades que n\u00e3o me acompanham mais:<\/p>\n A de desejar um passado que desse na porta certa<\/p>\n <\/p>\n O mundo segue em julgamento e tons de guerra<\/p>\n Continuo me distraindo com ip\u00eas em floresc\u00eancia<\/p>\n Quero servir ao c\u00e3o na rua, \u00e0 fam\u00edlia e a sua esmola mas<\/p>\n Sou pouca, um dia de cada vez<\/p>\n (mal tenho servido a mim mesma)<\/p>\n <\/p>\n Meu amigo est\u00e1 enlouquecido, palavras de ordem<\/p>\n Se for somente para ficar rouca, nem quero<\/p>\n Um minuto de in\u00e9rcia, por favor, no planeta inteiro<\/p>\n E por um minuto, pela primeira vez, o mundo estaria a salvo.<\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n CUIDADO<\/strong><\/p>\n <\/p>\n N\u00e3o tenho falado desta tristeza que assola a terra<\/p>\n Porque tenho medo de que a semente que plantei<\/p>\n Escute<\/p>\n <\/p>\n E ao que nasce<\/p>\n \u00c9 preciso dar alguma esperan\u00e7a.<\/p>\n <\/p>\n <\/p>\n Poeta, nascida e residente em Belo Horizonte. Publicou F\u00e1bulas para adulto perder o sono (Pr\u00eamio Paran\u00e1 de Literatura 2013, ed. Biblioteca do Paran\u00e1), O nome do mundo (ed. Armaz\u00e9m da Cultura, 2014), S\u00f3, com peixes (ed. Confraria do Vento, 2015), Embrulhado para viagem (col. Leve um Livro, 2016), Garrafas ao mar (ed. Penalux, 2018), Arraial do Curral del Rei \u2013 a desmem\u00f3ria dos bois (ed. Conceito Editorial, 2019) e Eva-proto-poeta (ed. Caos & Letras, 2020).<\/p>\n ***<\/p>\n Confira tamb\u00e9m o que a nossa colunista Maria Alice Bragan\u00e7a fala sobre uma das obras da autora:<\/p>\n![\"\"](\"https:\/\/redesina.com.br\/wp-content\/uploads\/2021\/07\/foto-eu-laf-preto-e-branco-150x150.jpg\")
ADRIANE GARCIA<\/strong><\/p>\n